Inédito no mundo, estudo da FMABC identifica lesões em retina de pacientes graves com Covid-19

Pesquisa com pacientes internados em UTI foi publicada na British Journal of Ophthalmology, conceituada revista científica do Reino Unido

Pesquisa liderada pela disciplina de Oftalmologia do Centro Universitário Saúde ABC / Faculdade de Medicina do ABC (FMABC), em Santo André (SP), acaba de ser publicada pela prestigiada revista científica do Reino Unido, a British Journal of Ophthalmology (BJO), referência mundial na área de saúde ocular. Estudos, ainda preliminares, indicam a associação entre a infecção pelo novo coronavírus e lesões de retina em pacientes graves internados em Unidade de Terapia Intensiva (UTI). A amostra envolve 18 pacientes avaliados no mês de maio no Hospital Estadual Mário Covas.

Com a chegada da pandemia, médicos residentes e fellows da Oftalmologia da FMABC decidiram estudar o acometimento oftalmológico em pacientes com Sars-CoV-2, vírus causador da Covid-19. Foram feitos vários estudos dentro da temática, inclusive com pesquisa de vírus na lágrima e de secreção conjuntival. O principal achado, e considerado ponto central do estudo, é que as alterações retinianas descobertas podem sugerir complicações semelhantes em outros órgãos do corpo humano, o que facilita a compreensão da doença e favorece a escolha de um tratamento mais assertivo e eficaz aos pacientes.

A partir da dilatação ocular foram descobertas anormalidades em dez dos pacientes avaliados. Os principais achados foram lesões vasculares agudas da retina interna, inclusive com hemorragias e lesões de padrão isquêmico, visíveis por manchas algodonosas e palidez setorial da retina. Os exames foram feitos por câmera digital de fundo de olho e os pacientes avaliados por dois especialistas em retina. Vale ressaltar que, até então, outros estudos clínicos feitos por pesquisadores brasileiros e estrangeiros investigaram manifestações oculares em pacientes com diagnóstico de Covid-19, mas estes predominantemente conduzidos após a alta hospitalar. O ineditismo envolve a análise feita em pacientes ainda durante o período de internação em UTI.

“O que observamos na retina pode ser considerado um reflexo do que está acontecendo no resto do corpo do paciente. É aí que está a importância do exame e como os nossos resultados podem ajudar a melhorar a compreensão sobre a doença. As alterações microvasculares observadas na retina muito provavelmente estão acontecendo também nos pulmões, cérebro, rins, e demais órgãos, desempenhando um papel importante na gravidade da doença. Ao entendermos melhor os efeitos da Covid-19 no organismo, conseguimos auxiliar o tratamento e o cuidado aos pacientes de maneira mais eficaz”, explica o chefe do Setor de Retina da FMABC, Dr. Julio Zaki Abucham Neto, um dos orientadores do estudo.

Os resultados também sugerem que, além de danos pela atividade direta do Sars-CoV-2, o estado pró-trombótico relatado em pacientes críticos pode levar a lesões retinianas, uma vez que cerca de 31% dos pacientes com quadro grave de Covid-19 apresentam complicações dessa natureza. A trombose é causada por coágulos sanguíneos parciais ou totais em alguma veia ou artéria do corpo humano, fato que limita o fluxo normal de sangue no organismo. Os achados foram possíveis, entre outros fatores, pois a retina é um dos tecidos mais ativos metabolicamente no corpo humano e sua circulação terminal é particularmente sensível a eventos isquêmicos, caracterizados pela dificuldade de circulação do sangue.

“Entendemos que nossos resultados podem qualificar o entendimento da fisiopatologia da doença, o que é fundamental para a prescrição de tratamentos efetivos e mais adequados às necessidades dos pacientes”, completa o médico residente de Oftalmologia e autor principal da pesquisa, Dr. Leonardo Amarante Pereira.

Os pacientes que participaram do protocolo de pesquisa e sobreviveram seguem em monitoramento pelas equipes. A maioria daqueles que apresentaram lesões agudas na retina durante a internação se recupera sem maiores sequelas, o que corrobora a evidência de que foram alterações transitórias causadas pela doença.

REFERÊNCIA NACIONAL

Dada a mobilização mundial de pesquisadores e cientistas acerca do tema, a relevância da pesquisa coloca mais uma vez a FMABC na vanguarda do conhecimento científico e em permanente sintonia com as novas tecnologias responsáveis por fortalecer o combate à pandemia. “Nosso estudo seguramente elenca a FMABC entre as entidades de ensino do Brasil e do mundo que mais se mantém atualizadas e na fronteira do conhecimento”, completa o chefe da disciplina de Oftalmologia da FMABC, Dr. Vagner Loduca.

Além de Loduca, o estudo tem orientação do vice-reitor do centro universitário, Dr. Fernando Luiz Affonso Fonseca, e do chefe do Setor de Retina da FMABC, Dr. Julio Zaki Abucham Neto. Também assinam a pesquisa os colaboradores do Setor de Retina e Vítreo da FMABC, Dra. Priscila Alves Nascimento e Dr. Hebert Toshiaki Sakuma, a pesquisadora do Laboratório de Análises Clínicas da FMABC, Dra. Glaucia Luciano da Veiga, além dos médicos residentes Leonardo Amarante Pereira, Larissa Caroline Mansano Soares e Luciano Rabello Netto Cirillo. O grupo de estudo também conta com a colaboração do médico residente Lucas Figueiredo Lacerda e da fellow do Setor de Plástica Ocular da FMABC, Dra. Raíssa Figueiredo Lacerda.

A íntegra da pesquisa pode ser acessada pelo link https://bjo.bmj.com/content/early/2020/10/15/bjophthalmol-2020-317576.

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